Entregadores e motoristas trabalham 7 horas a mais do que profissionais do setor privado
Quando chega em casa entre uma jornada de trabalho e outra, Antônio Ferreira, de 35 anos, está exausto. Às 7 horas da manhã, o entregador sai para fazer as primeiras viagens do dia e só retorna nove horas depois. No meio da tarde, consegue fazer uma pausa para comer e tomar banho. O desejo é descansar, mas a necessidade fala mais alto e ele volta para rua, onde trabalha até meia-noite quase que diariamente. A rotina cansativa não compensa financeiramente, mas a falta de opção é o motor para que ele continue como um dos 57 mil trabalhadores de plataformas na Bahia que recebem o menor rendimento mensal do país.
Os dados sobre trabalho por meio de plataformas foram coletados pela primeira vez pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e estão reunidos na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC). O levantamento revela uma realidade conhecida pelos trabalhadores baianos que têm rotinas desgastantes e recebem pouco por isso. Participaram da pesquisa entregadores de delivery e motoristas de aplicativos entre outubro e dezembro de 2022.
Na Bahia, os profissionais de plataforma recebem, em média, R$1.719 por mês, o que representa o menor rendimento do país. A média nacional é de R$ 2.645. Os baianos trabalham 7 horas a mais por semana e ganham, por hora, R$9,60 – menos R$0,30 do que a média do setor privado no estado. As 16 horas de trabalho de Antônio, por exemplo, lhe rendem uma remuneração de R$1.400 já com o desconto de R$300 do combustível mensal.
O técnico de enfermagem se tornou entregador do IFood em 2018 e o caminho trilhado até entrar no universo das plataformas foi marcado pela falta de oportunidades. Diante da necessidade de sustentar a casa e um filho de 13 anos, a única opção foi se tornar entregador. “Eu fico até meia-noite na rua e chego em casa muito cansado. É uma rotina que deixa a gente esgotado”, desabafa. Trabalhadores como Antônio representam 1,1% de todos os profissionais do setor privado da Bahia, de acordo com o IBGE.
O dia a dia dele se repete entre os grupos de entregadores que reúnem suas motocicletas e bicicletas em estacionamentos de shoppings ou postos de gasolina da capital baiana. Um deles é Gustavo Jordann, de 32 anos. Ele começou a rodar como entregador em 2018 por indicação de um amigo. Desde então, as horas gastas com o aplicativo são a principal fonte de renda que sustenta a casa e três filhos de 10, 4 e 3 anos.
“Todos os dias eu chego em casa muito cansado. As crianças querem sair e brincar, mas eu quase nunca consigo”, diz ele que trabalha das 7 horas às 20 horas todos os dias. Ele até tentou usar os estudos como forma de mudar de realidade em 2019, mas, sem dinheiro para pagar as mensalidades, precisou desistir do curso técnico de enfermagem. No final do mês, o salário de R$1.500 mal dá para pagar as contas. “Quando coloco na ponta do lápis, nem vale a pena o tanto que a gente trabalha, mas tem que continuar porque não tem outra opção”, lamenta.
Fonte:www.correio24horas.com.br
Gustavo Jordann começou a trabalhar como entregador em 2018, apesar da formação como técnico em enfermagem. Crédito: Ana Lucia Albuquerque/CORREIO