Bolsonaro se torna o primeiro mandatário a não conseguir a reeleição desde que ela passou a valer no país
Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito novamente presidente do Brasil. De acordo com projeção do Datafolha, o líder petista venceu o segundo turno da disputa, realizado neste domingo (30), ao derrotar o atual chefe do Executivo, Jair Bolsonaro (PL), o primeiro a não conseguir a reeleição.
Segundo dados da apuração realizada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) atualizados até as 19h05 deste domingo (30), Lula tem 50,50% dos votos válidos, contra 49,50% do atual presidente da República.
Para projetar a vitória de um candidato, o Datafolha acompanha os dados da apuração e, por meio de um sistema próprio, faz a projeção do resultado considerando o peso que cada mesorregião tem em relação ao total de eleitores de cada estado.
Quando há um número razoável de votos apurados em todas as mesorregiões, seguindo composição do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), há um ponto em que é possível estimar que um candidato não pode mais ser ultrapassado, e, portanto, projetar sua vitória.
Quando assumir, em janeiro, Lula, 77, será o mais velho ocupante do cargo na história. Será sua terceira passagem pelo governo, que liderou em dois mandatos (2003-2010).
Após a altamente incomum campanha de 2018, quando os brasileiros elegeram um obscuro deputado federal dono de um discurso radical de direita em reação à implosão vigente do sistema partidário tradicional, desta vez a maioria do eleitorado buscou conforto numa figura conhecida.
Com efeito, Lula passou a jornada eleitoral vendendo a ideia de uma volta ao passado, quando a economia mundial era outra e favorável ao Brasil. Os diversos escândalos de corrupção associados ao seu partido, o PT, mantiveram sua rejeição alta, acima dos 40%, mas o caráter plebiscitário do pleito foi pior para Bolsonaro, que sempre registrou ao menos 50% de ojeriza dos eleitores.
O então candidato petista não quis se comprometer com soluções claras para problemas centrais, de resto inexistentes também na retórica radical de Bolsonaro, que passou todo o seu mandato em uma escalada autoritária que culminou nas investidas contra o próprio sistema eleitoral que o gerou.
Desde 2020, fala-se abertamente acerca do golpismo do atual presidente e qual apoio ele poderia angariar, levando até a inusuais manifestações em favor da democracia brasileira feitas pelos EUA.
Essa degradação institucional também favoreceu a figura apresentada por Lula, de compromisso com a democracia e com a previsibilidade, ainda que ele tenha pedido um cheque em branco ao eleitor, já que não colocou no papel as propostas citadas em discursos. Em janeiro de 2023 será conhecido o seu valor.
A campanha, salvo lamentáveis episódios em que houve mortes, só esquentou retoricamente ao longo do segundo turno, após Bolsonaro chegar a ele com uma votação superior à que se antecipava com base nas pesquisas. Voto útil de eleitores de Ciro Gomes (PDT) e abstenção foram apontados como responsáveis.
Pelo caminho ficaram o pedetista e Simone Tebet (MDB), surgidos das ruínas do projeto de terceira via que vitimou João Doria (ex-PSDB, fora do pleito), Sergio Moro (União Brasil, eleito senador) e tantos outros. Ciro parece no ocaso de sua carreira; Tebet, no começo. Ambos apoiaram Lula, mas a emedebista ganhou assento e voz na campanha, sugerindo que o governo do petista será de transição.
Durante a campanha, houve alguma oscilação nas curvas de intenção de voto, em geral favorável a Bolsonaro, favorecido pelo maior tempo de exposição do eleitorado à propaganda de suas medidas populistas —outro resto a pagar para Lula Mas ao fim o desenho da disputa se manteve muito estável.
O arco narrativo entre o momento em que o petista deixou o poder, com popularidade acima de 80%, e seu triunfo agora é marcado por uma das maiores reviravoltas já registradas na política brasileira.
Em 2010, Lula conseguiu eleger a sucessora ungida, Dilma Rousseff (PT). Até 2013, ela registrava índices de aprovação até superiores aos do mentor, mas as ruas colapsaram nos atos de junho daquele ano.
As massas que ocuparam cidades inicialmente pelo reajuste da tarifa do transporte liberaram uma energia de protesto represada havia anos no país. A classe média ganhou corpo e, com ela, um eleitorado conservador mais aguerrido em um ambiente usualmente habitado pela centro-esquerda.
Dilma conseguiu se reeleger em 2014, mas com muita dificuldade. Seu rival à época, Aécio Neves (PSDB), iniciou um movimento de contestação de sua legitimidade e foi seguido por um Congresso cada vez mais insatisfeito com a ruína econômica que a petista começava a entregar na forma de recessão.
Ao mesmo tempo, desde aquele ano, a Operação Lava Jato trouxe níveis inauditos de revelações de corrupção envolvendo o mundo político, o PT à frente, mas não só. O clima de indignação, particularmente na classe média ante uma esquerda cada vez mais atônita, deu continuidade aos movimentos de 2013.
Fonte:www1.folha.uol.com.br